quarta-feira, 27 de abril de 2011

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DIARIO DE PERNAMBUCO
INTERIOR
História de um povo em busca de suas raízes
Descendentes dos primeiros holandeses, Gangarras do Bandeira driblam a miséria e o preconceito

André Duarte
Da equipe do DIARIO
Eles são loiros, têm olhos claros, pele alva e continuam vivendo em regime de reclusão involuntária em pleno Agreste. Numa pequena vila rodeada por casas de taipa, ruas de terra batida e total ausência de infra-estrutura, 340 pessoas tentam manter uma história registrada apenas pela tradição oral. Tratam-se dos Gangarras do Bandeira, remanescentes de uma comunidade encravada a seis quilômetros do município de Brejo da Madre de Deus.Pouco se sabe do passado, mas o preconceito dos moradores da cidade acabou batizando a todos. O termo gangarra surgiu de um periquito de cor amarelada e de canto estridente, numa referência à cor dos cabelos e ao sotaque frenético dos moradores do Sítio Bandeiras. Ninguém sabe ao certo como seus antepassados chegaram até lá, tampouco a origem de características físicas tão distintas do povo da região.
Casas de taipa denunciam a pobreza da comunidade localizada no município de Brejo da Madre de Deus.
Exceto pelo aspecto europeu e do passado misterioso, pouca coisa difere o cotidiano vivido por qualquer morador da zona rural. A agricultura familiar vem sendo a fonte de subsistência há séculos, acrescentada da pesca proporcionada pela grande bênção da população: a Barragem do Machado. No entanto, a falta de políticas públicas, aliada à consciência histórica abalada pela falta de vestígios concretos do passado, fez dos galegos do Bandeira um povo esquecido nas barbas de um grande pólo de desenvolvimento econômico, impulsionado pelas indústrias de confecção de Santa Cruz do Capibaribe e Toritama. Pobreza - Além de duas igrejas minúsculas, sendo uma católica e outra evangélica; uma pequena escola primária; uma mercearia e um bar improvisado; nada mais lembra a vila próspera de mercadores e agricultores que gerou algumas personalidades marcantes do início do século 20. Exceto por bicos conseguidos em cidades vizinhas, a sobrevivência dos gangarras depende de poucas cabeças de gado, que se alimentam da única cultura resistente ao verão: a palma.

Jovens ainda predominam entre as 340 pessoas que vivem na vila.
A pobreza acabou gerando o êxodo e, consequentemente, comprometendo a continuidade da tradição e da perpetuação da identidade local. "Sóficaram os que não puderam pagar aluguel em Santa Cruz do Capibaribe. Uns foram para São Paulo, mas não voltaram por falta de dinheiro mesmo. Minha sorte é que eu abri esse bar e tem uns aqui que bebem tanto que dá pra sobreviver", revela José Manoel da Silva, proprietário da único bar, que costuma concentrar diariamente dezenas de jovens desempregados da vila. Nascido e criado na comunidade, Cícero José da Silva, 65, lembra muito bem dos atritos entre os gangarras e os moradores de Santa Cruz do Capibaribe em função das brincadeiras com a cor da pele e dos cabelos. "Antigamente tinha muita briga com o povo da cidade por conta disso. Hoje em dia está mais calmo. Mas a pobreza sempre foi muito grande e acabou piorando com a seca. Hoje em dia eu me incomodo é com a situação da gente. O apelido eu até gosto".

Pobreza local gerou êxodo dos moradores, que acabaram migrando para cidades vizinhas ou para a região Sudeste
Falta de estudo aumenta estigma
A incerteza sobre os antepassados e inexistência de documentos que comprovem a origem da vila do Bandeira acabou proporcionando aos gangarras o estigma de povo sem passado. Entre as famílias, pouco se sabe sobre como foram parar no Agreste. O mistério sobre o legado histórico deu margem a correntes sobre a origem de característica tão pitoresca, mas em todas elas somente a hipótese da ascendência européia que levariam no sangue serve como tese de convergência. Exceto por iniciativas isoladas, pouco foi documentado sobre o assunto a ponto de revelar com segurança a herança genética dos galegos. A versão mais seguida pelos moradores aponta que a comunidade é fruto da rebeldia de um grupo de vinte holandeses, que se recusaram a deixar a então província de Pernambuco durante a expulsão holandesa, em 1654. A falta de dinheiro para viabilizar uma mudança para outra colônia e o desinteresse em voltar à terra natal teriam levado o grupo a fugir dos portugueses se embrenhando às margens do rio Capibaribe até encontrarem um esconderijo no Agreste. Os gangarras não sabem, mas seriam descendentes dos únicos holandeses que driblaram a Restauração Pernambucana. "Trata-se de uma minoria que não pôde voltar e que encontrou no local onde hoje está a vila um esconderijo seguro", aponta o pesquisador Ronaldo Nerys, defensor da tese holandesa. Diante da omissão do poder público no resgate da identidade dos gangarras, Nerys fundou, em parceria com outros estudiosos, o Instituto Pernambucano de História, Arte, Cultura e Cidadania, de onde já surgiram outras vertentes para a origem do povoado. A mais recente aponta que a razão dos traços arianos nada mais é do que uma influência genética de antepassados portugueses da região do Douro, onde a mistura com os espanhóis resultou num semblante parecido como os invasores dos Países Baixos.O passado religioso também é outra incógnita. Mesmo sob tradição católica, paira no ar uma aura judaica difícil de ser fundamentada. "Na região há uma mistura entre cultura judaica e tradiçãomoura. Talvez isso explique a vocação para o comércio", diz Nerys.
Suposta pedra guarda resposta
Uma pedra perdida nos arredores da zona rural de Brejo da Madre de Deus é encarada por pesquisadores como a chave para a comprovação da origem européia dos Gangarras do Bandeira. Os moradores mais velhos, a maioria já falecidos, costumavam contar aos filhos sobre a existência de uma rocha crivada por quatro moedas de bronze e com dizeres em uma língua desconhecida. O local ainda é incerto à nova geração, mas a tal peça está sendo procurada por pesquisadores, que vêem na grafia estrangeira marcada na pedra o sinal indiscutível da presença européia na região. "Os mais velhos relatavam que tinham umas inscrições em outra língua. Identificamos que pode ser uma grafia de origem flamenca, o que comprovaria essa linha de estudo sobre a origem holandesa. Já andei muito atrás dela, mas é preciso tempo e dinheiro para localizá-la", aposta Ronaldo Nerys, que busca apoio da Embaixada da Holanda para viabilizar as buscas. Em 2004, o documentário Gangarras do Bandeira, produzido pela Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj),proporcionou aos moradores o primeiro retrato da comunidade a partir da ótica da população. A diretora Cátia Oliveira, que conduziu as filmagens juntamente com Lulla Clemente, instituiu um prêmio ao morador que achar a peça. "Não tivemos tempo para procurar a pedra, mas a idéia é dar continuidade ao projeto".Os mais novos contam que a existência da rocha tomou ares de lenda antes do interesse dos pesquisadores. "Já me disseram que a pedra veio do Egito. Os moradores mais velhos contavam que a pedra ficava a uns seis quilômetros da vila, mas o pessoal daqui nunca se interessou. Não tenho idéia de onde minha família veio. Talvez agora possa dizer pro povo da cidade que sou um galego do estrangeiro", diverte-se José Severino da Silva.



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